Washington, 23 de julio de 2015.- O recente desempenho econômico da América Latina põe em evidência os vínculos mais estreitos entre a região e a Ásia. A China, em especial, tornou-se uma fonte essencial de demanda para as commodities latino-americanas nas últimas duas décadas, proporcionando ganhos significativos à região. Neste contexto, a desaceleração estrutural da taxa de investimento chinesa tem causado forte pressão sobre os preços de commodities e sobre os países que as exportam.
Mas a Ásia pode ser bem mais do que apenas uma fonte de ganhos (e prejuízos) passageiros para a América Latina. Em particular, ela pode contribuir para um crescimento mais duradouro, propiciando lições sobre integração regional bem-sucedida e permitindo o aprofundamento de vínculos transpacíficos. Contudo, para alcançar tais benefícios, serão necessários objetivos claros e realistas, traçados dentro de uma estratégia de longo prazo, e atenção às implicações políticas e sociais associadas a um aumento da integração econômica.
Vínculos econômicos mais estreitos
As relações econômicas entre a América Latina e a Ásia foram significativamente fortalecidas nos últimos 15 anos. Os fluxos comerciais entre as duas regiões se multiplicaram por 10 desde o ano 2000. O fortalecimento dos vínculos comerciais foi acompanhado por iniciativas capazes de intensificar esta relação ainda mais, como acordos bilaterais de comércio, a Aliança do Pacífico e a criação de novos bancos multilaterais de desenvolvimento.
A ascensão da China tem sido um importante fator neste processo, mas não o único. Os vínculos econômicos com outros países asiáticos também se intensificaram. Por exemplo, a Coreia galgou várias posições no ranking dos maiores parceiros comerciais do Brasil, Chile e Peru desde o ano 2000.
A Índia e o Japão, por sua vez, também são importantes parceiros comerciais de vários países da América Latina.
Os vínculos financeiros e de investimento também ganharam importância, embora ainda exista espaço para um crescimento mais robusto. O investimento estrangeiro direto japonês na América Latina superou os US$ 110 bilhões entre 2005 e 2014. Além disso, o investimento estrangeiro direto chinês na região registrou um aumento acentuado nos últimos anos, passando de um total de US$ 6 bilhões entre 1990 e 2009 para uma média de US$ 10 bilhões ao ano de 2010 a 2012, segundo dados coletados pela Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (CEPAL).
…em meio a oportunidades ainda pouco aproveitadas Há grande potencial para aprofundar as relações econômicas entre a Ásia e a América Latina.
A expansão do comércio entre as duas regiões tem sido desigual. Apesar de um certo crescimento das exportações com maior valor agregado, as exportações da América Latina ainda são dominadas por matériasprimas, ao passo que as importações vindas da Ásia concentram-se em bens manufaturados. Embora esse fenômeno reflita vantagens comparativas, também sugere que a América Latina não conseguiu tirar proveito dos crescentes fluxos comerciais para transformar suas próprias estruturas econômicas, que continuam relativamente pouco diversificadas. Assim, os efeitos em termos de transmissão de conhecimento e inovação que normalmente acompanham as relações comerciais permaneceram limitados. Pautas de exportação pouco diversificadas e a limitada complexidade econômica também restringiram o surgimento de cadeias de valor na região, com a notável exceção da integração do México no complexo manufatureiro norte-americano.
Enquanto isso, os padrões do comércio dentro da Ásia mudaram drasticamente nos últimos 20 anos. Em especial, a China emergiu como um eixo dinâmico de grandes fluxos comerciais (e, mais recentemente, do investimento), estimulando avanços tecnológicos, a transferência de know-how e o surgimento de cadeias de valor mundiais. Esse processo não se desenrolou de maneira uniforme por toda a Ásia (conforme destacado em um estudo recente do Banco Asiático de Desenvolvimento).
Algumas sub-regiões permaneceram relativamente desconectadas da integração comercial e do dinamismo econômico da região. Obstáculos internos, como o fraco ambiente de negócios, seriam alguns dos principais motivos.
Aproveitando o potencial Obstáculos internos também podem ajudar a explicar por que a América Latina não conseguiu desenvolver complementaridades produtivas nem relações comerciais intrarregionais mais profundas como as observadas na Ásia.
Uma série de gargalos do lado da oferta, como sistemas de ensino deficientes, lacunas na infraestrutura, ambientes de negócios difíceis e diversas barreiras comerciais têm restringido a expansão da produtividade, freado o investimento e a inovação e limitado os ganhos do estreitamento comercial com outras economias. Adicionalmente, a forte alta dos preços das commodities entre 2003 e 2011 também ajudou a reforçar o modelo de crescimento predominantemente impulsionado por matérias primas.
Para transformar o comércio em um motor do crescimento sustentável, as autoridades latinoamericanas precisarão reduzir obstáculos agudos já conhecidos (por exemplo, infraestrutura deficiente e elevados custos dos transportes). Mas também é crucial adotar uma perspectiva estratégica mais ampla:
- Uma visão realista do crescimento. Em um cenário de preços mais baixos das commodities, condições menos favoráveis para a obtenção de financiamento externo e margem de manobra reduzida da política macroeconômica, alcançar um crescimento robusto será mais difícil do que foi na década anterior. As perspectivas dependerão de esforços contundentes para lidar com deficiências estruturais de longa data que ainda prejudicam o investimento e a produtividade na região.
- A maior integração comercial pode estimular o desenvolvimento de economias latino-americanas mais fortes, mas os objetivos precisam ser realistas. Estudos empíricos indicam que a integração comercial tende a produzir efeitos positivos sobre a produtividade e a transferência de conhecimento. Mas não se trata de uma solução mágica. Os esforços para impulsionar o comércio intrarregional e fortalecer os vínculos com a Ásia precisarlo encontrar respaldo em agendas nacionais de reforma, destinadas a criar melhores condições para a iniciativa empresarial, a inovação e a diversificação.
- Apoio político é fundamental. Apesar dos benefícios a nível agregado, o aumento da integração comercial pode gerar efeitos divergentes sobre diferentes segmentos da sociedade. Administrar bem essas implicações e garantir que ganhos agregados sejam compartilhados é crucial para manter o apoio político em favor de uma maior abertura.
Em suma, a América Latina pode transformar sua relação com a Ásia em uma fonte mais duradora de crescimento, em vez de uma fonte ocasional de ganhos e perdas. Isso se torna particularmente importante na atual conjuntura, em vista das fracas perspectivas de crescimento e da possibilidade de que a desaceleração da taxa de investimento na China continue afetando negativamente os mercados mundiais de commodities. Aprofundaremos esse tema no nosso próximo relatório sobre as perspectivas econômicas regionais, e também durante o Encontro Anual em Lima, Peru, a ser realizado em outubro deste ano.